BeatBossa

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

um conto

reencontro

Os olhos deles se encontram depois de meses de silêncio e telefones não tocados:

- Quem bom te ver!

Quanto cinismo, ele pensa, tentando disfarçar um visível mal-estar, uma mariposa na garganta, um vontade perturbável de gritar.

- Eu gostaria de poder dizer o mesmo.

Essa mania de dizer a verdade a qualquer preço. Atira esperando uma reação real dela, é certamente um teste, ela está impassível, mas o sorriso é nervoso.

- Por que você ta dizendo isso, adorei o nosso último verão.

- Teve alguém que ficou de me ligar depois daquilo e... estou esperando até hoje a ligação, um e-mail, uma mensagem. Mas tudo bem, o gosto de ser usado é bom às vezes, mas não por quem a gente sente algo de verdade.

Agora é nocaute. Ela se rende. Fica nervosa, mas jamais admitirá que o erro foi seu. Astuta, acabará saindo como mocinha no final do filme.

- Sério? Eu não lembro da parte em que eu tinha que ligar pra você. Por que você não ligou?

Eu falei.

- Acho que pelo mesmo motivo que você não ligou e pelo motivo que leva a gente a não ligar um para o outro quando a saudade bate na porta, ou quando a única pessoa em que penso antes de dormir é você.

- Que motivo seria esse?

- Talvez medo de sofrer... não sei. Você não respondeu por que não me ligou.

- Se você quisesse falar comigo poderia ter ligado.

Ela sempre se esquiva. Sorrio, incomodado. A questão não é essa, o cerne todo não é esse. Ligar ou não ligar. Vivemos a nossa guerra-fria, temos um pacto de destruição mútua tácito, mas ninguém solta a primeira bomba, a tensão nos alimenta, nos nutre com a sua neura, sua ansiedade, seus medos, sua precaução. Nada acontece realmente. Nos olhamos nos olhos com uma tristeza, com uma lembrança triste do tempo em que éramos felizes e não pensar no subjuntivo era agradável como um café da manhã a dois depois de uma saudável noite de sexo.

Ou. Ela pode simplesmente me ignorar. Fazer-se de magoada ou chateada, ou sei lá o quê. Fingir que tudo aquilo foi apenas diversão. E já não significamos nada além de memórias e fotografias guardadas um para o outro. A gente nunca sabe, até viver.

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falar de sentimento sempre me soa piegas. mas se o pessoa tava certo em dizer que todas as cartas de amor são ridículas, todas as historias sobre amor também poderiam ser? tirando o "amor nos tempos do coléra", que é sensacional, não lembro de histórias de amor bem contadas.

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