BeatBossa

segunda-feira, novembro 17, 2008

Os Incompreendidos, parte 2



O que dizer de um clássico? Para evitar ficar repetindo o que já disseram sobre “os incompreendidos” não li nada sobre o filme, além daquilo que já sei sobre François Truffaut e a nouvelle vague, o que não quer dizer que não vou estar dizendo coisas que outros já viram ali. O filme conta a história do garoto Antoine Doinel, que vive espremido com seus pais em um pequeno apartamento. Na primeira cena do filme vemos uma gravura de uma pin-up sendo passada entre os garotos durante uma aula de francês, e justo na mão de Antoine o professor pega a gravura e o coloca de castigo e sem recreio. Esta é só a primeira de uma série de injustiças que o pobre vai sofrer durante o filme. Não que ele seja um santo, muito pelo contrário, o fato é que ele é apenas um garoto que gosta de aprontar algumas de vez em quando, por pirraça, por diversão, ou simplesmente porque é da natureza dele, não que ele queira realmente fazer mal algum a alguém. Como quando perguntado pela psicóloga porque ele roubou o dinheiro da sua avó, ele responde que pensou que ela não ia precisar mais, já que estava morrendo mesmo. Antoine não é uma doença, é um sintoma de um mundo em transformação, de um mundo que não aceita mais a tirania dos professores, e no qual os pais tem que trabalhar muito para sustentar a casa e pouco tempo têm para se preocupar com os filhos; adorável é a cena onde o professor de educação física sai com os alunos para correr nas ruas, e aos poucos vemos os alunos fugindo ou se escondendo, até que de repente o professor está sozinho e continua correndo, sem perceber que todos sumiram nas suas costas. Antoine é fruto de um novo tipo de família, seu pai, não é seu pai biológico, e mesmo que tenhamos a impressão de que o homem gosta mesmo do garoto, a primeira coisa que faz é se livrar dele quando os problemas surgem, sem escrúpulo algum, afinal, não é seu filho mesmo, e o fato de ter lhe dado um nome não quer dizer que deva ter mais responsabilidades. A mãe é uma mulher ambígua, em momentos tive a impressão de que ela pouco ligava para o garoto, em outros momentos ela age como se lhe amasse perdidamente. E parece que a verdade só surge quando Antoine conta para a psicóloga que sua mãe não queria tê-lo, e se não fosse pela sua avó ela teria abortado, pense no que isso pode causar na cabeça de um jovem (pré)adolescente (não sei a idade dele, mas acho que ele deve ter algo entre 13 e 15, senão menos). Qual a solução? Fugir. E é o que ele faz, indo morar com um colega cuja família também é um retrato da decadência dessa instituição: o pai trabalha demais, a mãe é alcoólatra e parece pouco ligar para o que o filho anda fazendo. Antoine passa alguns dias morando na casa do seu amigo sem ser notado, até quando eles tentam roubar uma máquina de escrever do escritório onde o pai de Antoine trabalha. Como não conseguem vender, a ingenuidade deles só acha uma resposta: devolver. É quando ele vai preso e passa a noite na cadeia, ao lado de prostitutas e bandidos de verdade. É como dizem, a cadeia é a escola do crime, e um reformatório não parece estar longe disso, é o ensino médio da delinqüência. Este é apenas o primeiro filme de uma aparente saga que Truffaut criou, e pelo que me parece todos estreados pelo mesmo ator Jean-Pierre Léaud (me corrijam se disse bobagem), que também estreou alguns filmes de Godard (Masculino-Feminino (1966), A Chinesa (1967), Made in USA (1966), pelo menos os que vi), segundo dizem, adorado pela sua facilidade em improvisar, o que para caras como Godard, devia ser um barato. Não sei se dá pra dizer que há um paralelo entre o realismo italiano, e entre a nouvelle vague. Mas sinto em ambos uma necessidade de mostrar um mundo em transformação, uma sociedade que mudava a olhos vistos, e também, claro, a necessidade de fazer um cinema diferente, mais real, mais documental, mais social. Usar atores amadores, filmar nas ruas (como a desesperada busca de pai e filho pela bicicleta no clássico italiano “Ladrões de Bicicleta” (1949, Vitorio de Sica), que tem um dos finais mais tristes que já vi), improvisar, trazer um pouco do teatro para o cinema (que é um pouca a leitura que tenho de alguns filmes do Pasolini). Como disse, essa é a minha leitura do filme, e você pode concordar com ela, ou não.
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